A divulgação e a popularização da ciência representa um fator de evidente importância na construção da avaliação crítica do mundo globalizado contemporâneo. Ações diversas que promovam a desmistificação da ciência junto à comunidade, além de favorecer a ampliação de horizontes culturais, permitem também que se manifestem novas vocações científicas nos jovens.
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Segundo o físico Ildeu de Castro Moreira, professor da UFRJ e diretor do Departamento de Popularização e Difusão da Ciência do Ministério da Ciência e, Tecnologia (MCT)*, a população brasileira não conhece os seus próprios cientistas e muito menos, a ciência e tecnologia aqui produzidas. Assinaladas como uma das prioridades do MCT em seu Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional, iniciativas para a popularização da ciência, assim como estratégias para a melhoria de seu ensino nas escolas, felizmente, vêm multiplicando-se, em nosso país.
“Os museus de ciência precisam ser um elemento para a renovação da escola, pois trazem a visão da ciência de uma forma mais arejada e interessante”, ressaltou o Prof. Ildeu, na abertura do Workshop Sul-Americano de Mediação em Museus e Centros de Ciências, realizado de 1 a 6 de setembro, em Copacabana.
Durante o evento, que comemorou os 10 anos do Museu da Vida - entidade de divulgação científica localizada na Fundação Oswaldo Cruz – o diretor do Departamento de Popularização da Ciência aproveitou para convidar todos os presentes, pesquisadores, professores, estudantes e comunicadores de ciência a se integrarem às atividades da 5a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, que ocorrerá de 20 a 26 de outubro, em mais de 400 cidades brasileiras. |
Ildeu de Castro Moreira |
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Em entrevista exclusiva concedida ao
Portal dos Fármacos, Ildeu de Castro Moreira abordou diferentes questões referentes à popularização das Ciências Farmacêuticas no Brasil.
Portal: Por que é importante divulgar e popularizar a ciência, principalmente a ciência dos fármacos e medicamentos?
Ildeu de Castro: Devemos divulgar e popularizar a ciência porque ela é importante para as pessoas. Cada vez mais a ciência e a tecnologia estão permeando as atividades em nossa vida cotidiana. Tanto no plano individual como no coletivo, precisamos de conhecimentos científicos básicos para poder inovar, criar novos produtos e isso pode representar oportunidade de emprego para a população e também desenvolvimento para o nosso do país.
Por outro lado, a ciência é um conhecimento essencial à humanidade e as pessoas têm o direito de conhecer as grandes descobertas como a Teoria da Evolução, Teoria da Relatividade, os fármacos, entre outras. Então é importante que a divulgação científica seja feita e seja de boa qualidade. É fundamental melhorar a educação de ciência na escola.
No caso específico dos fármacos a população tem grande interesse, por causa de todas as questões que afetam a saúde do corpo humano. É importante que as pessoas conheçam a sua ciência, até para não serem enganadas.
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Portal: O Sr. acredita que quando a população compreender que existe uma ciência por trás dos medicamentos ela vai passar a conscientizar-se mais sobre o seu uso?
Ildeu de Castro: Eu acredito que sim, mas isso é um processo complexo. As pessoas sabem que, na área da medicina e da saúde, nós temos conhecimentos milenares. O homem, em diversas civilizações, aprendeu a usar as plantas e tudo mais para descobrir seus remédios. A ciência moderna deu um caráter racional a isso, com estudos cuidadosos, onde se avaliam os riscos e as vantagens e desvantagens. Portanto, o conhecimento maior da população sobre os fármacos, ou seja, a ciência que está por trás dos medicamentos, é importante para que as pessoas possam utilizar o conhecimento cientificamente apurado para melhorar a sua saúde e não prejudicar, pelo contrário.
A automedicação é uma questão séria, mas também, muitas vezes resulta de a população ter pouca possibilidade de acesso ao atendimento médico. As pessoas fazem uma opção gerada pelo seu bom senso ou até por conhecimentos tradicionais da sociedade brasileira. Isso acontece no mundo inteiro por isso é importante não termos uma posição muito moralista em relação a essa questão. Nós temos que entender porque a população faz isso e convencê-la de que é imprescindível utilizar, com cuidado, os medicamentos. |
Portal: A divulgação da ciência dos fármacos e medicamentos poderia ajudar a população ter uma posição mais crítica em relação à indústria farmacêutica?
Ildeu de Castro: Com certeza. Se você fizer uma divulgação científica bem feita as pessoas irão ter uma visão crítica, não só em relação à indústria farmacêutica, como também quanto às companhias de energia, às companhias telefônicas e tudo mais. Nós vivemos em um sistema capitalista, onde o interesse pelo lucro é freqüentemente. Ele é prioritário em relação aos interesses das pessoas. Então o conhecimento da ciência é fundamental para a população ter uma visão crítica contra governos, contra as empresas, contra os interesses que estão por trás de todo o aparato científico e tecnológico. A ciência não é neutra, os produtos que as pessoas compram nas farmácias, drogarias, supermercados e nas lojas carregam um interesse, uma propaganda, às vezes, enganosa. A melhor defesa contra isto é o espírito crítico.
Portal: O Sr acha que a divulgação das Ciências Farmacêuticas no ensino fundamental poderia estimular a formação de novos cientistas em nosso país?
Ildeu de Castro: Não sei. Isso precisa ser muito bem feito, temos que tomar cuidado para não colocarmos no ensino fundamental o ensino de tudo. As nossas crianças já têm muita informação dentro da escola e também fora dela. Temos que trabalhar muito bem os métodos para transmitir esses conteúdos. Acredito que o fundamental é que as crianças tenham estímulo à curiosidade, à criatividade, a pensar, a experimentar e a desenvolver um espírito de informação da natureza. Isso será útil para a Física, Metereologia, Farmácia, para as Engenharias, entre outras ciências. Se conseguirmos mobilizar as crianças pelo estímulo à curiosidade, despertando o interesse delas, aí teremos um número de estudantes se dirigindo para as carreiras científicas, médicas, tecnológicas e etc.
Portal: Como inserir a ciência dos fármacos e medicamentos no cotidiano da comunidade. Existe uma metodologia apropriada, uma recomendação do MCT?
Ildeu de Castro: Na realidade o que a gente faz é estimular a produção. Temos guias de divulgação científica, fazemos a cada Semana Nacional de Ciência e Tecnologia um tablóide, estamos criando um grande portal de popularização da ciência, junto com o MEC. Apoiamos iniciativas como cartilhas, livros, programa de rádio, etc. O nosso papel é estimular as instituições de pesquisas, universidades, escolas a produzirem o material e fazerem a divulgação dos mesmos. |
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Portal: Como o Sr. vê a responsabilidade dos jornalistas e dos meios de comunicação em divulgar as novas descobertas na área dos fármacos e medicamentos.
Ildeu de Castro: É uma responsabilidade grande, por isso a divulgação precisa ser feita com muito cuidado. Certamente algumas empresas “douram a pílula”, literalmente. Acho que o jornalista tem que ser bastante crítico. Para mim, o papel do jornalista ,em geral, seja ele de qualquer área, econômica, política ou científica, é passar informações de maneira correta, respeitando os limites e os riscos inerentes em cada empreendimento científico e tecnológico. Ter uma visão crítica é fundamental para todo jornalista.
O cientista, entusiasmado por suas descobertas, tende a exagerá-las. É muito difícil você ter o discernimento de qual a relevância, o impacto de uma determinada descoberta. Coisas que em certo momento se achou que não eram importantes, tornaram-se muito relevantes ao longo do tempo, e coisas que se pensava que tivessem um impacto muito grande na ciência não tiveram. A história da ciência está cheia disso. Então é sempre bom ter um olhar crítico. Os jornalistas estão em uma constante busca por novidades, acho que, às vezes, até de maneira exagerada. Mas isso faz parte do jogo, as pessoas gostam de coisas novas, faz parte do ser humano.
É bom também que a gente tenha o entendimento de que o processo de comunicação do jornalista é diferente do cientista. Evidentemente existem contradições entre eles, é normal que tenha, acho que é até uma tensão essencial entre a comunicação da ciência e a sua profissão. É claro que temos que trabalhar com isso de uma maneira integrada, não criando falsos conflitos e reconhecendo os olhares distintos. O tempo e a abordagem do jornalismo é diferente da do cientista. Isso tem que ser reconhecido, entretanto, ambos precisam trabalhar com competência e ética.
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Portal: Qual a importância de se realizar a divulgação científica do trabalho de pesquisa realizado pelos Institutos do Milênio, futuros Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia?
Ildeu de Castro: Acho que cada vez mais a divulgação da ciência está de certa maneira contemplada nos projetos dos Institutos. É importante que o resultado das pesquisas sejam comunicados para a população. Primeiro porque ela tem direto de saber, pois são instituições que são pagas com dinheiro público, então é fundamental que o público tenha acesso ao que está sendo feito, tenha conhecimento das pesquisas relevantes e como elas poderão se reverter em benefício para a própria população.
Precisamos entender a divulgação da ciência como uma questão democrática que permite que a população, como um todo, tenha uma cultura científica mais elevada. Se a população entender que as pesquisas são importantes, ela certamente vai usar os seus direitos democráticos, a sua pressão política, para que a ciência tenha mais recursos. É um jogo que interessa a ambos se for bem feito.
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Portal: Qual a sua expectativa para a 5ª Semana Nacional de Ciência e Tecnologia?
Ildeu de Castro: A quinta edição da Semana vai acontecer entre os dias 20 a 26 de outubro, sendo que em alguns estados vai começar mais cedo, por causa das eleições. Esse ano tomamos como tema principal a questão da evolução e da diversidade, em função das comemorações dos 150 anos da Teoria da Seleção Natural. Vamos repetir o sucesso das edições anteriores, no ano passado atingimos 400 cidades, esse ano iremos além.
Serão realizadas atividades em todo o Brasil, em praças, nos centros das cidades, em barcos. Com a divulgação de vídeos de ciência, palestras nas escolas, feiras de ciências, entre outras ações. Todos os estados brasileiros participam da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia. Em cada estado temos coordenações locais e o Ministério da Ciência e Tecnologia assume a coordenação geral e dá apoio financeiro a essas atividades.
Qualquer professor, pesquisador, estudante pode organizar um evento dentro da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia. É importante que as pessoas inscrevam os seus trabalhos no site da semana (
http://semanact.mct.gov.br) para podermos divulgar a programação completa das atividades.
*O Departamento de Popularização e Difusão da Ciência e Tecnologia (DEPDI) está ligado à Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social (SECIS) do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e tem por finalidade subsidiar a formulação e implementação de políticas, programas e a definição de estratégias à popularização e à difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos, nas diversas instâncias sociais e nas instituições de ensino.